Os produtores de alimentos confrontam-se, cada vez mais, com as necessidades específicas dos consumidores que sofrem de doença celíaca ou que têm uma intolerância alimentar. Desta forma, e para auxiliar as pessoas intolerantes ao glúten e com doença celíaca a identificar e a escolher um regime alimentar variado de acordo com as suas necessidades, os géneros alimentícios devem ter a informação sobre a ausência ou a presença reduzida de glúten nos mesmos.

O glúten é uma proteína composta existente no interior dos grãos dos cereais. Nas plantas cumpre a função de guardar nitrogénio e carbono para que as sementes germinem. Não possui calorias ou função importante para o organismo. A sua principal característica é a sua função na panificação, acrescentando viscosidade e elasticidade às massas de pães.
É ao conjunto das proteínas insolúveis na água que se chama genericamente glúten. Está presente na maioria dos cereais: trigo, espelta, cevada, centeio, kamut, triticale e aveia.
A fração de proteína responsável pelo efeito tóxico para os celíacos – prolaminas – tem um nome diferente dependendo do cereal: a gliadina (no trigo), secalina (no centeio), ordem (na cevada) e avenina (na aveia).
A sua “agressividade” depende da composição e como esta não é igual em todos os cereais, eles são tolerados de forma diferente. Assim, enquanto o trigo, o centeio e a cevada têm de ser completamente afastados da alimentação do celíaco, outros cereais como o milho e o arroz são perfeitamente inofensivos1.
Mas nem todas as pessoas são afetadas da mesma maneira. Algumas pessoas não suportam determinados alimentos, pois quando estes são ingeridos e entram em contacto com a mucosa do intestino, vão desencadear reações mais ou menos violentas que provocam lesões e perturbam o seu normal funcionamento, nomeadamente no que diz respeito à digestão e
absorção.
Diz-se então que existe uma INTOLERÂNCIA ALIMENTAR, a qual pode ser contra variados alimentos e ma-nifestar-se por períodos mais ou menos longos da vida destes indivíduos.
Quando uma situação deste tipo possui também uma COMPONENTE IMUNOLÓGICA e GENÉTICA, e diz respeito especificamente ao GLÚTEN, manifestando-se de forma permanente e definitiva, podemos dizer que se trata de DOENÇA CELÍACA (DC)2.

Regulamento nº 828/2014

Para auxiliar as pessoas intolerantes ao glúten e com doença celíaca a identificar e a escolher um regime alimentar variado de acordo com as suas necessidades, os géneros alimentícios devem ter a informação sobre a ausência ou a presença reduzida de glúten nos mesmos.
Mas há normas estabelecidas sobre a informação prestada aos consumidores sobre a ausência (“isento de glúten”) ou a presença reduzida de glúten (“teor muito baixo de glúten”).
Algumas pessoas com intolerância ao glúten podem tolerar pequenas quantidades variáveis de glúten dentro de certos limites. De modo a que as pessoas possam encontrar no mercado uma variedade de géneros alimentícios adequados às suas necessidades e ao seu nível de sensibilidade, deve haver disponibilidade de produtos com diferentes teores baixos de glúten dentro desses limites. É importante, no entanto, que os vários produtos sejam rotulados adequadamente, a fim de assegurar a sua utilização correta por pessoas com intolerância ao glúten.
Por outro lado, deve também ser possível que um alimento que contém ingredientes naturalmente isentos de glúten ostente uma menção que indique a ausência de glúten.
Assim, e de acordo com o Regulamento nº 828/2014 que entrou em vigor no passado dia 20 de julho de 2016, a menção «isento de glúten» só pode ser utilizada se os géneros alimentícios, tal como vendidos ao consumidor final, não contiverem mais de 20 mg/kg de glúten. Já a menção «teor muito baixo de glúten» só pode ser utilizada se os géneros alimentícios que são constituídos ou que contêm um ou mais ingredientes provenientes do trigo, do centeio, da cevada, da aveia ou das suas variedades cruzadas e que foram especialmente transformados para reduzir o teor de glúten não contiverem, tal como vendidos ao consumidor final, mais de 100 mg/kg de glúten.

Em relação à aveia, já que a maioria das pessoas com intolerância ao glúten pode incluir a aveia no seu regime alimentar sem que tal implique efeitos adversos na sua saúde, também tem requisitos adicionais para os géneros alimentícios que contêm aveia. A aveia contida nos géneros alimentícios apresentados como isentos de glúten ou com um teor muito baixo de glúten tem de ser especialmente produzida, preparada e/ou transformada de modo a evitar a contaminação com trigo, centeio, cevada ou as suas va-riedades cruzadas, e o teor de glúten dessa aveia não pode ser superior a 20 mg/kg.

Contaminação cruzada e segurança alimentar

No entanto, a contaminação da aveia com trigo, centeio ou cevada que pode ocorrer durante a colheita, o transporte, a armazenagem e a transformação dos cereais suscita uma grande preocupação. Por conseguinte, o risco de contaminação com glúten dos produtos que contêm aveia deve ser tomado em consideração no que se refere à prestação de informações sobre esses produtos alimentares pelos operadores de empresas do setor alimentar.
Mas não é só a contaminação da aveia com outros cereais que podem causar problemas nas pessoas com intolerância alimentar ou com doença celíaca, pois existem outros perigos.
Por isso, uma unidade fabril que pretenda conceber produtos alimentares isentos de glúten, deve cum-prir com estritas normas de segurança alimentar de modo a evitar toda e qualquer possibilidade de contaminação cruzada. São necessárias instalações e sistema de ventilação próprios, não partilhados e não comunicantes com instalações para a confeção de produtos com glúten, maquinaria, utensílios, fardas, toucas e calçado para uso exclusivo. A escolha dos ingredientes e o seu rastreamento é de fulcral importância. Por outro lado, produzir alimentos isentos de glúten, na área da panificação e pastelaria, exige uma formação específica, para que o estabelecimento se torne ainda mais credível junto de clientes com esta restrição alimentar.

O celíaco procura, acima de tudo, segurança alimentar. Para estes, a escolha de determinado tipo de alimento assenta, primeiro que tudo, na garantia de que existe isenção de glúten. Ou seja, se o alimento é isento em glúten não só em termos de ingredientes base mas, também sem qualquer possibilidade de contaminação cruzada na produção, embalamento, transporte e exposição na prateleira da padaria, pastelaria ou supermercado.

A correta rotulagem dos produtos é essencial

No seguimento da aplicação deste Regulamento, e tendo em atenção a necessidade de prestar informação ao consumidor sem cair em excessos, a Direção-Geral da Alimentação e Veterinária (DGAV), a pedido da Associação Portuguesa de Celíacos (APC) e com a colaboração desta entidade, publicou uma nota orientadora destinada aos operadores da indústria alimentar.
Nessa mesma nota, podemos ler a seguinte lista de produtos em que não é admissível a menção “isento de glúten”, por ser evidente a isenção e improvável a contaminação (incluindo a tecnicamente inevitável).
• Frutas, legumes (hortícolas) e ervas aromáticas frescas e desidratadas
• Leguminosas secas – feijão, grão-de-bico, favas, ervilhas, lentilhas, soja, tremoço
• Arroz e milho em grão
• Leite cru ou sujeito a processo térmico, com teores variáveis de gordura
• Queijo fresco e requeijão
• Carne, peixe e mariscos não processados
• Ovos frescos
• Açúcar
• Mel
• Sal
• Azeite e outros óleos vegetais
• Água
• Néctares e sumos de fruta
• Vinhos e bebidas espirituosas
• Café torrado em grão

Contudo, pode ser utilizada a menção “isento de glúten” noutros alimentos que não o contenham, dado o risco real de contaminação e o risco percebido pelos consumidores celíacos ou encarregues de efetuar por estes as escolhas alimentares (pais e cuidadores), como por exemplo todos os produtos de moagem de grãos isentos de glúten, como as farinhas de milho e arroz, especiarias, iogurtes e leite condensado, batatas fritas.

Artigo elaborado por Sandra Barreiros
Jornalista da ACIP

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1www.glutenzero.pt

2 www.celiacos.org.pt